Em todas as áreas do Direito é impossível que a legislação acompanhe as evoluções das relações sociais do relacionamento humano, ainda mais em tempos de franca globalização e evolução tecnológica.
As relações de trabalho também não são exceções a este ponto, é particularmente impossível que a legislação trabalhista acompanhe o tempo real das evoluções das relações de trabalho. Inclusive, no Brasil tal situação demanda ainda maior cuidado, uma vez que diversas áreas do poder se mostram radicais a alterações legislativas.
Importante salientar que pequenas e médias empresas são responsáveis por mais de 84% dos empregos criados no primeiro trimestre de 2019, sendo que este número deve se manter nos dias atuais, tornando estes empreendedores cada vez mais relevantes para o mercado de trabalho.
Não por poucas vezes observamos discussões acaloradas entre parlamentares sob o prisma de críticas e defesas ao liberalismo econômico, por muitas vezes confundindo falhas naturais do mercado (e do ser humano) com uma suposta imoralidade do sistema de mercado capitalista.
Durante boa parte da história do Direito do Trabalho brasileiro se viu vigente a regra de que o trabalhador se encontra em uma posição de hipossuficiência em relação ao seu empregador, motivo pelo qual a proteção do Estado deve sobrepesar esta diferença de forças.
Felizmente, a Lei nº 13.467/2017, chamada de “reforma trabalhista” trouxe uma quebra deste paradigma de hipossuficiência em qualquer relação de trabalho, regra tão enraizada no arcaico regramento jurídico laboral, quebra esta consubstanciada na nova redação do parágrafo único do artigo 444 da CLT.
Em suma, este artigo diz que as relações de trabalho podem ser objeto de livre estipulação entre as partes (desde que não se contravenha as disposições legais), esta livre estipulação terá eficácia sobre as normas coletivas, tendo força de lei, para os empregados dotados dos requisitos de diploma de nível superior e salário mensal igual ou superior ao teto do INSS.
Em outras palavras, este artigo diz que alguns empregados estão imersos em situações de maior ou menor hipossuficiência em relação ao seu empregador, algo inovador no nosso sistema legal, criando-se o jargão “negociado sobre o legislado”, também presente no artigo 611-A da CLT.
A geração de empregos na atual realidade de mercado não se da por proteção e extensão de garantias legais arcaicas, mas este sistema deve garantir a criação de condições para se estimular o mercado de forma digna, lembrando sempre que a maioria dos postos de trabalho são de responsabilidade das pequenas e médias empresas, ou seja, não há espaço para a “lógica” da figura do empregador como o poderoso empresário explorador dono dos meios de produção.
Nenhuma reforma, ou legislação irá gerar empregos por si só, mas flexibilizações e atualizações dentro da noção de modernidade do regramento legal para tentar acompanhar as novas relações de trabalho se torna ferramenta essencial para a busca de um bem comum pautado pela promoção de igualdade de oportunidades.
Alguns funcionários, por conta de sua formação, capacidade, rendimento, e pela alteração do mercado de trabalho, possuem tal poder de barganha para com o empregador que a noção de hipossuficiência assume a forma de uma tênue linha.
É o que comumente vemos com jogadores profissionais de futebol, cujo rendimento e valor de mercado colocam estes atletas em posições de barganha inclusive superiores a dos seus empregadores.
Apesar de não termos uma flexibilização legal gradativa da hipossuficiência nas relações de trabalho, esta mudança de paradigma é de suma importância para acompanhar a modernização das relações de trabalho, até por que temos cada vez mais mão de obra mais especializada e qualificada.
Assim, um caminho de modernização legal é exatamente a noção do “negociado sobre o legislado”, onde situações de não hipossuficiência trabalhista assumem eficácia de lei, ou negociações coletivas com força de lei, dando mais margem para que as relações de trabalho possam caminhar numa velocidade mais adequada a evolução do mercado.
Por fim, nenhuma modernização legal pode atingir um nível de eficácia aceitável se os operadores do judiciário não referendarem tais alterações, como é visto no país com as mudanças legais da Lei nº 13.467/17, onde muitos magistrados deixam de aplicar o novo texto que somente se efetiva quando a jurisprudência é uniformizada nos tribunais superiores (e às vezes nem assim).
Na Europa se observou o fenômeno de criação de postos de trabalho depois que as Cortes Constitucionais daqueles países referendaram as alterações do regramento legal (lembrando que cada vez mais a nossa curva demográfica se assemelha a do velho continente), conforme exemplos lembrados pelo saudoso Ministro Ives Grande Martins Filho, quando cita Portugal, Espanha, Alemanha, França e Itália.
Desta Forma flexibilizações como a da hipossuficiência do empregado são necessárias para acompanhar a evolução das relações de trabalho, e uma vez referendadas pelas Cortes Superiores, se tornam mecânicas de busca pelo bem-estar social e promoção da igualdade de oportunidades, que são mais palpáveis e reais do que aquela noção de igualdade de resultados defendida por aqueles que ainda acreditam na falida economia planificada.
Por Michael Notarberardino Bos. Advogado do escritório Durvalino Picolo Advogados Associados. Especialista em Direito do Trabalho.