Esclarecimentos quanto a MP 927/2020: Mudanças nas relações de trabalho em razão do COVID-19

Do dia 22/03(domingo) para hoje 23/03(segunda) fora apresentada a Medida Provisória nº 927/2020 pelo Governo Federal, trazendo algumas mudanças provisórias nas relações de trabalho, em razão do COVID-19.

Estas mudanças irão perdurar enquanto se mantiver o estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto nº 6 de 2020.

Assim, seguem alguns dos principais pontos da referida Medida Provisória.

I. O estado de calamidade pública (Decreto nº 6 de 2020) constitui, para fins laborais, “força maior” nos termos do art. 501 da CLT:

A MP instituiu que as consequências econômicas da pandemia vivida estão inclusas no conceito de força maior, assim, caso a empresa (ou sua filial) seja extinta em razão das consequências do COVID-19 (situação deve estar fartamente comprovada) os empregados terão direito à indenização da seguinte forma:

i. Empregados dotados de estabilidade – Direito ao um mês de salário de indenização, não sendo necessário aval do sindicato profissional para a rescisão do contrato de trabalho;

ii. Empregados sem estabilidade – Direito a metade do valor de sua rescisão;

iii. Empregado contratado por prazo determinado – Direito a metade da multa do art. 479 da CLT.

É lícita a redução geral de salários dos empregados, proporcionalmente aos vencimentos de cada um, não podendo se tratar de uma redução de mais de 25% (vinte e cinco por cento).

II. Acordo individual escrito

Durante o período referido nesta MP o empregado e o empregador podem celebrar acordo individual escrito (visando garantir a permanência do vínculo), tal acordo irá valer frente a própria CLT e normas coletivas, ressalvado o regramento disposto na Constituição Federal.

III. Medidas podem ser adotadas sem a necessidade de acordo coletivo

Estas medidas são: Teletrabalho; Antecipação de férias individuais; Concessão de férias coletivas; Aproveitamento e a antecipação de feriados (feriados não religiosos federais, estaduais, distritais e municipais); Banco de horas; Suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho; e Diferimento do recolhimento do FGTS.

O empregador pode alterar o regime de trabalho (presencial, teletrabalho ou trabalho remoto) seguindo seus critérios e necessidades, ficando dispensado o registro prévio de alteração no contrato de trabalho, mas deve ser avisada ao empregado com antecedência mínima de 48 horas, sendo que o empregador fica responsável por arcar com os insumos necessários para que o funcionário possa realizar o trabalho a distância, despesas estas que devem constar em contrato escrito (prévio) ou no prazo de 30 dias a contar da mudança do regime de trabalho. Estas despesas não integram salário.

O tempo de uso de aplicativos e programas de comunicação fora da jornada de trabalho normal não constitui tempo à disposição, regime de sobreaviso, exceto se houver disposição em contrário em norma coletiva.

Estagiários e aprendizes também ficam incluídos nestas disposições.

IV. Antecipação de férias

As férias podem ser antecipadas (as pessoas que pertencem ao grupo de risco do Covid-19 devem ter preferência), ainda que o período aquisitivo a elas não tenha transcorrido, porém, não podem ser de menos de cinco dias corridos, e sua concessão deve ser precedida por aviso (por meio escrito ou eletrônico) em no mínimo 48 horas.

O pagamento do terço constitucional das férias pode ser pago até a data em que é devida a gratificação natalina, e o pagamento das férias pode ser feito até o quinto dia útil do mês subsequente ao início do gozo das férias.

Por meio de acordo individual escrito empregados e empregadores podem negociar antecipação de períodos futuros de férias.

Preferencialmente com antecedência de 48 horas, os profissionais da área da saúde ou aqueles que desempenhem funções essenciais, podem ter suas férias ou licenças remuneradas suspensas, durante o período de calamidade pública decretada.

V. Das férias coletivas

Os empregadores podem, a seu critério, conceder férias coletivas, com notificação escrita antecipada de no mínimo 48 horas, não sendo aplicáveis os limites mínimo e máximo contidos na CLT, não sendo necessário notificar o órgão local do Ministério da Economia e a Comunicação aos Sindicatos.

VI. Banco de horas

O empregador pode interromper as atividades do empregado e constituir regime especial de compensação de horas, por meio de banco de horas que deve ser estabelecido por acordo individual ou coletivo, com compensação em até 18 meses, contado da data de encerramento do estado de calamidade púbica.

A compensação do tempo interrompido pode ser feito mediante prorrogação de jornada, com o limite de duas horas, não podendo ultrapassar 10 horas diárias.

VII. Suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho

Durante o período de calamidade pública fica suspensa a obrigatoriedade do empregador realizar exames médicos admissionais, clínicos e complementares (mantém-se a obrigatoriedade do demissional), que devem ser realizados posteriormente no prazo de 60 dias contados do encerramento do período de calamidade.

VIII. Direcionamento do trabalhador para qualificação (REVOGADO)

O empregador pode suspender o contrato de trabalho pelo prazo de 4 meses para enviar o profissional para curso de programa de qualificação não presencial, independentemente de negociação coletiva, com registro em carteira, podendo ainda conceder ajuda compensatória mensal a este funcionário, valor este que não integra salário.

Em razão das críticas de setores sindicais, da imprensa, Congresso Nacional e Câmara dos Deputados o Presidente Jair Bolsonaro revogou o artigo 19 da MP que permitia a suspensão do trabalho pelo prazo de 04 meses.

IX. Do diferimento do recolhimento do FGTS

As competências de março, abril e maio do ano corrente, com vencimento em abril, maio e junho do mesmo ano estão com sua exigibilidade suspensa, podendo seu recolhimento ser realizado de forma parcelada, sem juros, correção, multa e encargos, em até seis parcelas com vencimento no sétimo dia de cada mês a partir de julho.

Para aderir a esta prerrogativa o empregador deve declarar as informações até o dia 20 de junho de 2020.

No caso de demissão, o Recolhimento do FGTS é normal, apenas sem a incidência de multa e dos encargos do art. 22 da lei nº 8.036/90, devendo ser recolhido também o valor do mês da rescisão e do imediatamente anterior (art. 18 da mesma lei).

X. Funcionários da área de saúde

Estes podem ter sua jornada prorrogada nos termos do art. 61 da CLT abaixo, podendo também adotar escalas de horas suplementares entre a décima terceira e a vigésima quarta hora do intervalo interjonada, sem penalidade, sendo estas horas a mais compensadas em 180 dias a contar do encerramento do decreto de calamidade pública.

Art. 61 – Ocorrendo necessidade imperiosa, poderá a duração do trabalho exceder do limite legal ou convencionado, seja para fazer face a motivo de força maior, seja para atender à realização ou conclusão de serviços inadiáveis ou cuja inexecução possa acarretar prejuízo manifesto. § 1º – O excesso, nos casos deste artigo, pode ser exigido independentemente de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho. § 2º – Nos casos de excesso de horário por motivo de força maior, a remuneração da hora excedente não será inferior à da hora normal. Nos demais casos de excesso previstos neste artigo, a remuneração será, pelo menos, 25% (vinte e cinco por cento) superior à da hora normal, e o trabalho não poderá exceder de 12 (doze) horas, desde que a lei não fixe expressamente outro limite. § 3º – Sempre que ocorrer interrupção do trabalho, resultante de causas acidentais, ou de força maior, que determinem a impossibilidade de sua realização, a duração do trabalho poderá ser prorrogada pelo tempo necessário até o máximo de 2 (duas) horas, durante o número de dias indispensáveis à recuperação do tempo perdido, desde que não exceda de 10 (dez) horas diárias, em período não superior a 45 (quarenta e cinco) dias por ano, sujeita essa recuperação à prévia autorização da autoridade competente.

Importante observar que nos casos de contaminação do COVID-19 não serão considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação de nexo causal.

Durvalino Picolo Advogados Associados
Angelo Antonio Picolo e Michael Bos